Tem gente que coleciona garrafas de cerveja, as expõem
na estante como se cada gole, cada levedura, cada sabor pudesse permanecer em
sua boca.
Tem gente que coleciona corações como se fossem
troféus, como se cada pessoa que lhe deu o coração o tivesse perdido para
sempre.
Tem gente que coleciona decepções, não percebendo que a
única decepção que se pode ter é consigo mesmo.
Tem gente que coleciona vitórias, as grita aos quatro
ventos, como se as derrotas não fossem importantes.
Tem gente que coleciona medos; não sai de casa, não
caminha à noite, não fala o que pensa, não vive.
Tem gente que, inclusive, coleciona vazios. Eu,
coleciono auroras. Sempre que posso, acordo cedo e vejo o sol nascer. Assim
como não se pode entrar duas vezes no mesmo rio, pois ele nunca é o mesmo, nem
você, nunca uma aurora é igual à outra.
Já vi auroras da mesma janela, num dia lilás e com
direito a trovões azul-celeste ao oeste, e noutro vestida em brumas, noiva do
dia.
Já vi auroras refletidas nos açudes, no espelho da
lagoa, nas pedras da rua e nas paredes das casas.
Já vi auroras onde o azul-claro e o rosa namoravam
entre nuvens. Já vi auroras no campo, sempre mais sonoras.
Já vi auroras sob o negrume da tempestade, detrás do
verde-musgo do vendaval.
Já vi auroras por entre as venezianas, esmaecidas pelas
cortinas. Mas nenhuma delas se compara à aurora do teu olhar... Onde o sol não
nasce pra todos.
(Danilo Kuhn)
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