sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Oração a São Lourenço

A vós que ardestes nas brasas da incompreensão, eu rogo compreensão. Porque cá na Terra não mais me entendem, tapam os ouvidos, desviam o olhar.
Ninguém fala a minha língua, me parece que cada um tem a sua. Ninguém conversa comigo, me parece que só escutam a si mesmos.
A vós que fostes fiel e corajoso, eu suplico amizade. Porque cá na Terra a traição é epidemia, e a covardia é lei. Amigos apunhalam-me pelas costas, inimigos não têm coragem de mostrar a face.
A vós que sabeis que a verdadeira riqueza é a bondade, eu imploro intercessão. Intercedei no meu coração e ilumina-o, livra-o de todo o mal, porque a escuridão do mundo ameaça anoitecer-me. E que a centelha acendida em mim por vós incendeie meu coração e que as trevas se rendam às chamas.
Amém.
(Danilo Kuhn)


sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Pra te cativar


Pra te cativar, enluarei meus olhos – lua cheia a te espiar pelas frestas da janela.
Pra te cativar, ensolarei meu sorriso – sol nascente de aquarela a luzir teu dia.
Pra te cativar, sussurrei ao pé do ouvido – brisa matinal carregando o gorjear dos passarinhos.
Pra te cativar, perfumei minhas palavras – jardim florido dançando aromas ao teu redor.
Pra te cativar, mergulhei no teu olhar – águas calmas, praia mansa, porto seguro.
Pra te cativar, eu, que era cativo de mim mesmo, me libertei pra ti.

(Danilo Kuhn)

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Diário de um pomerano


Acordo cedo para recepcionar meu companheiro de jornada, o qual me saúda do horizonte com um aceno de aurora.
O aroma e o sabor do café da manhã despertam a casa.
Rumo à lavoura ouvindo a rádio do interior, feita de cantos de pássaros, da canção do vento, dos matos e dos riachos, das vozes das crianças, dos animais da criação e do percutir da enxada na terra.
Quanto mais árduo o trabalho, mais forte é a alma.
Retornando ao lar, o amor tornado visível: minha esposa se reflete na mesa posta, na casa limpa, nos bichos bem tratados, no olhar doce dos filhos.
Em casa, falamos em pomerano, nossa língua. Sua escrita se perdeu entre guerras e provações do passado. Por isso, prezo falar. Quanto mais falamos, mais nos tornamos o que somos.
As mãos rudes não impedem de falar por entre as flores:
- Ik dáu dot bláuma futéla!

(Danilo Kuhn)